Durante a campanha de 2022 o presidente Lula (PT) criticou o sigilo imposto pelo então presidente Jair Bolsonaro para certos gastos do seu governo.
Até prometeu, em debate com seu concorrente na televisão, acabar com essa prática se fosse eleito de novo pela terceira vez para o Palácio do Planalto.
Ficou apenas na promessas de campanha: várias despesas do seu governo nesse novo mandato têm sido mantidas sob sigilo, com base na mesma legislação utilizada por seu antecessor.
É o que explica o jornalista André Shalders:
“O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) colocou em sigilo pelos próximos cinco anos a lista das pessoas que ocuparam 57 quartos do hotel de luxo JW Marriott Grosvenor House, em Londres. Ao todo, o governo brasileiro gastou R$ 1,47 milhão com o estabelecimento, sendo R$ 140 mil para duas salas de reuniões no hotel.
O chefe do Poder Executivo brasileiro esteve na Inglaterra em maio para a coroação do rei Charles III, que ascendeu ao trono após a morte de sua mãe, Elizabeth II. O governo foi procurado por meio da Secretaria de Comunicação da Presidência, mas ainda não se manifestou.
Além da comitiva oficial, também ficaram no hotel os integrantes do chamado Escalão Avançado (Escav) que é responsável pela preparação da viagem. O grupo permaneceu no local de 26 de abril até 9 de maio. Lula chegou à cidade em 5 de maio – o evento, na Abadia de Westminster, ocorreu no dia seguinte. O quarto em que o presidente ficou hospedado com a primeira-dama Rosângela Silva, a Janja, saiu por R$ 43.986,60 a diária. Ao todo, 80 pessoas participaram da viagem.
‘As Comitivas Técnica e de Apoio são constituídas por servidores que atuam em áreas meio para a viabilização dos eventos com a participação do presidente da República. Assim, a relação dos servidores que compõem estas comitivas são informações que são classificadas pelo Gabinete de Segurança Institucional no grau de sigilo reservado, com fundamento no art. 25, VIII, do Decreto nº 7.724, de 16 de maio de 2012’, disse a Casa Civil em resposta a um pedido da Lei de Acesso à Informação (LAI), em 15 de fevereiro deste ano. Durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, o GSI já adotava conduta de classificar como reservados os relatórios de viagens nacionais e internacionais dos presidentes da República. Os documentos só são liberados cindo anos depois.
Mesmo tendo negado acesso à lista das pessoas que se hospedaram no hotel, a Casa Civil marcou a resposta como ‘acesso concedido’, como se tivesse entregado a informação pedida. Como regra, todos os documentos do governo devem ser de acesso público – o chamado princípio da publicidade está inscrito na Constituição. No entanto, a Lei de Acesso à Informação estabelece algumas exceções em que o acesso pode ficar restrito. O grau de sigilo pode ser reservado (cinco anos); secreto (15 anos) ou ultrassecreto (25 anos).
Em alguns casos, a Lei de Acesso também permite ao governo restringir o acesso a informações por até 100 anos, sempre que se trate de ‘informações pessoais (…) relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem’, independentemente da classificação de sigilo. Como mostrou o Estadão, o governo Lula impôs o sigilo de 100 anos a 1.339 pedidos, que incluem desde visitas recebidas por Janja e Lula no Palácio da Alvorada até telegramas diplomáticos sobre o jogador de futebol Robinho, condenado na Itália por estupro.
A prática também era comum no governo de Jair Bolsonaro (PL), que impôs sigilo de 100 anos a informações requisitadas em 1.108 pedidos da Lei de Acesso à Informação, segundo dados levantados pela ONG Transparência Brasil. De acordo com relatório da organização, em vários casos houve mau uso do dispositivo da Lei de Acesso por parte do governo. É o caso de informações sobre entrada e saída de pessoas em prédios públicos, informações sobre a saúde de Bolsonaro durante a pandemia de covid-19; e um processo disciplinar já encerrado contra um ministro de Estado.
Durante a campanha eleitoral de 2022, Lula prometeu acabar com o mecanismo do sigilo de 100 anos, e tirar da obscuridade informações classificadas pelo então adversário. ‘No dia 2 de outubro, o povo vai te mandar pra casa. Farei um decreto para acabar com seu sigilo de 100 anos para saber o que esse homem esconde por 100 anos’, disse Lula a Bolsonaro num debate televisivo realizado pela TV Globo em setembro de 2022.
‘É uma coisa que nós vamos ter que fazer: um decreto, um revogaço desse sigilo que Bolsonaro está criando para defender os amigos’, disse Lula a uma rádio do interior de São Paulo, em junho de 2022…”
Fonte – Blog do Flávio Gomes de Barros