O Ministério Público Eleitoral (MPE) afirmou, ao se manifestar a favor da inelegibilidade de Jair Bolsonaro (PL) em parecer entregue na quarta-feira (12) ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que o discurso do ex-presidente na reunião com embaixadores em julho do ano passado no Palácio da Alvorada representou um ataque às instituições eleitorais com objetivo de abalar a confiança do eleitorado.
O ex-chefe do Executivo, de acordo com o MP Eleitoral, mobilizou parcelas da população contra o sistema eleitoral.
O vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, que assina o parecer, pede a condenação apenas de Bolsonaro e se manifesta pela absolvição de seu então candidato a vice-presidente, Walter Braga Netto (PL). Gonet entendeu que o general não participou dos fatos investigados.
As falas do então presidente naquela reunião, segundo o MP Eleitoral, configuraram uso indevido dos meios de comunicação, abuso de autoridade, abuso de poder político e desvio de finalidade. “O abuso de autoridade se revela, também aqui, pela circunstância de o discurso ter sido proferido pelo presidente da República, na qualidade de Chefe de Estado”, escreveu Gonet.
“O desvio de finalidade está caracterizado, bem como a ligeireza no trato com fatos oficiais e realidades fenomênicas, incompatível com o momento eleitoral e apta a provocar graves consequências sobre a aceitação da eleição realizada como instrumento de expressão lídimo da sociedade democrática”, argumentou.
“A busca do benefício pessoal também foi tornada clara. O uso de recursos estatais para a atividade da mesma forma está estampado nos autos. Todo o evento foi montado para que o pronunciamento se revelasse como manifestação do presidente da República, chefe de Estado, daí a chamada de embaixadores estrangeiros e o ambiente oficial em que a reunião ocorreu. O abuso do poder político está positivado”, alegou.
Gonet afirma em seu parecer que logo após a reunião no Palácio da Alvorada “percebeu-se uma inédita mobilização de parcelas da população que rejeitavam aberta e publicamente o resultado do pleito, por não serem legítimas”.
“É fato notório que surgiram acampamentos e manifestações de rua animados por pessoas convictas de que as eleições haviam sido fraudadas. Estão ainda muito presentes e nítidas as imagens do dia 8 de janeiro último de destruição e de acintosa violência aos Poderes constituídos. A gravidade do discurso contra a confiabilidade do sistema de votação eletrônica não poderia ter mais expressiva exposição”, argumentou.
Apesar de traçar uma relação entre o discurso de Jair Bolsonaro sobre eleições fraudadas e a mobilização de seus apoiadores em acampamentos e manifestações de rua, Gonet ressaltou que seu parecer não analisou os fatos do ponto de vista criminal. O vice-procurador-geral Eleitoral afirma que seu posicionamento não relaciona as ações de Bolsonaro com os atos criminosos do dia 8 de janeiro.
“O discurso de desconfiança nas eleições, se não rendeu ao candidato [Bolsonaro] a maioria dos votos nas eleições, mostrou-se evidentemente capaz de afetar a confiança de parcela da população na legitimidade dos resultados havidos. Atingiu-se, portanto, e de modo grave, bem jurídico central à ordem democrática”, escreveu Gonet.
“As críticas do Presidente da República, que assumiu a estatura de Chefe de Estado para proferi-las publicamente, somente têm como ser vistas como alerta para os brasileiros e para o mundo de que os resultados das eleições não podiam ser recebidos como confiáveis e legítimos – tudo isso, além do mais, num contexto em que pesquisas eleitorais situavam o adversário do investigado como melhor posicionado na preferência dos cidadãos”, sustentou.
Naquele encontro em julho de 2022, Bolsonaro voltou a colocar em dúvida, sem apresentar provas, a lisura do sistema eleitoral, a acusar, sem embasamento, as urnas eletrônicas de serem fraudadas e a atacar opositores e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do TSE.
O parecer final do Ministério Público Eleitoral, que veio logo após a última manifestação da defesa do ex-presidente, indica que a investigação terminou. Cabe agora ao ministro Benedito Gonçalves, relator da ação, elaborar seu relatório sobre o caso e escrever seu voto.
Depois disso, ele deve enviar um comunicado à presidência do TSE informando que a ação está pronta para ser julgada. É o ministro Alexandre de Moraes, presidente do tribunal, quem marca a data do julgamento.
A aposentadoria antecipada de Ricardo Lewandowski e a iminente saída de outros dois ministros do TSE levantam dúvidas com relação ao andamento da ação que pode tornar Bolsonaro inelegível por oito anos.
O futuro político do ex-presidente fica agora mais condicionado à nova composição da Corte, formada por sete ministros — dos quais três serão substituídos dentro de um mês. Passa, inclusive, por uma articulação de Alexandre de Moraes, presidente do TSE, sobre a definição dos dois novos ministros do tribunal e, com base nisso, sobre quando pautar o processo para julgamento.
A CNN procurou a defesa do ex-presidente, que não se manifestou até a publicação desta reportagem.
Fonte – CNN