A presidência da Câmara dos Deputados tem vivido uma transformação desde que Hugo Motta (Republicanos-PB) assumiu a liderança da Casa, colocando fim à gestão centralizadora de Arthur Lira (PP-AL). Em pouco mais de dois meses no cargo, Motta tem implementado mudanças que valorizam a colegialidade, reativam mecanismos regimentais e buscam proporcionar maior previsibilidade nas pautas legislativas.
Os principais sinais dessa transição incluem o fim dos grupos de trabalho criados fora do regimento interno — uma ferramenta frequentemente usada por Lira para controlar a tramitação de propostas estratégicas — e a reativação das comissões especiais e mistas. A nova presidência também passou a acordar com antecedência a agenda do plenário com os líderes partidários, prática que difere dos métodos adotados na gestão anterior.
A atuação de Motta no plenário tem sido mais comedida: ele presidiu apenas 10 das 23 sessões deliberativas realizadas até agora, totalizando pouco mais de 10 horas à frente do microfone. Aliados destacam que seu foco tem sido nos bastidores, especialmente na reaproximação com o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto, setores onde Lira gerou tensões públicas. Um exemplo dessa estratégia foi o acordo firmado com o ministro Flávio Dino para aumentar a transparência das emendas parlamentares.
A falta de uma pauta mais definida tem permitido o avanço de temas promovidos pela ala bolsonarista, como a proposta de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. No entanto, Motta tem se empenhado em frear a progressão da matéria, evitando que lideranças manifestem apoio formal ao pedido de urgência e obrigando o PL a buscar assinaturas de forma individual.
Apesar da mudança de estilo, as decisões estratégicas continuam sendo tomadas por um núcleo de influência que ainda envolve Arthur Lira e os líderes Luizinho Teixeira (PP-RJ) e Isnaldo Bulhões (MDB-AL) — um grupo informalmente conhecido como a “santíssima trindade”. A condução de Motta é vista por parlamentares como uma tentativa de equilibrar os interesses internos e diminuir o nível de polarização na Casa.
A principal dúvida, no entanto, está relacionada ao nível de autonomia do novo presidente e à sua capacidade de manter uma agenda independente diante das pressões políticas que continuam a influenciar os bastidores do Legislativo.