EuPor mais que seja frio – “uma barra de gelo”, dizem os dele –, Arthur Lira deve estar incomodado por ser ele, agora, o nome xingado pela voz das ruas.
Em todo o país, praticamente, ele foi alvo de protestos por ser – e é – diretamente responsável por colocar na pauta de votação da Câmara Federal o “PL do estupro”, como já ficou conhecido o projeto que quer mandar para a cadeia as mulheres que cometerem estupro após 22 semanas de gravidez.
Lira, sabe-se, queria agradar a turma mais reacionária que o Congresso Nacional já recebeu. Resultado: ganhou a paternidade, ainda que por adoção, do projeto que é xingado nas ruas de todo o país. Mais: vai estabelecendo a imagem de um homem cruel, a face mais perversa do Congresso Nacional.
A legislação brasileira sobre o tema já virou um consenso, mesmo no público conservador, mas a moçada quer lacrar – e este parece ser um caminho mais curto para ganhar pontos entre os “defensores da vida”.
Confesso que não conheço de perto ninguém que seja a favor do aborto. O que se pretendeu, sempre, foi descriminalizá-lo. Até porque as filhas da classe média – esta não é uma acusação, mas uma constatação – praticam o aborto em situações especiais e com condições de atendimento médico-hospitalar (carregam uma culpa dolorosa pelo ato, mesmo que as motivações sejam bastante aceitáveis). E vão continuar fazendo, seja qual for a lei vigente.
Lira deve saber disso e deve conhecer famílias que já passaram por isso, o que devia levá-lo a uma reflexão mais séria e honesta, humanizada – e não ser movido por mesquinhos interesses políticos.
Podia também ter lembrado o ditado português popularizado no Brasil por Tancredo Neves: “Esperteza, quando é muita, engole o dono”.
Fonte – Cada Minuto