Quase cinco anos após as primeiras desocupações dos imóveis localizados na zona de risco delimitada pela Defesa Civil Municipal, a área de exclusão da Braskem em Maceió ainda está sem um destino definido. Nem a Prefeitura Municipal, nem o Governo do Estado, e muito menos a própria Braskem, sabem o que fazer com a região afetada pela mineração. A área devastada pela mineradora permanece abandonada, lembrando uma cidade fantasma, com terrenos baldios acumulando lixo e insetos, em meio aos escombros dos prédios e casas desapropriados pela empresa entre 2020 e 2021.
O Instituto do Meio Ambiente (IMA) e o Conselho Estadual de Proteção Ambiental (Cepram) deram à Braskem, no final do ano passado, um prazo de 180 dias para apresentar um projeto de Reserva Particular de Proteção Natural (RPPN) como requisito para continuar as demolições dos imóveis condenados. Com o término do prazo previsto para o início de junho, a mineradora ainda não apresentou o projeto da RPPN. A empresa declarou que essa obrigação foi suspensa quando questionada sobre o atraso.
Dito isto, a Braskem se livrou da incumbência de apresentar um plano de recuperação da zona de exclusão e continua se achando dona de toda a área desapropriada por ela. Uma ação, movida pelo governo do Estado, tenta na Justiça desfazer o acordo firmado entre a Prefeitura de Maceió e a Braskem, com o aval dos órgãos de fiscalização e controle, que praticamente quita todas as obrigações que a empresa teria com a cidade, depois do repasse de R$ 1,7 bilhão para a gestão do prefeito JHC (PL).
Enquanto a questão não é decidida pela Justiça, os moradores da região dos Flexais, que ficaram isolados e cercados pelas demolições dos bairros que afundam, vivem com medo da insegurança e revoltados com o descaso das autoridades. “Estamos ilhados, sem comércio, sem serviços, sem acesso rápido ao Centro da cidade, vivendo ao Deus dará”, reclama o comerciante Valdemir Alves, morador do Flexal de Cima e integrante do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB).
De acordo com ele, os escombros dos imóveis desapropriados pela Braskem só servem para o que não presta. “Virou esconderijo de bandidos, de usuários de drogas, acúmulo de lixo, animais abandonados e insetos”, acrescentou Alves. Por isso, diz ele, que a comunidade dos Flexais, na sua grande maioria, defende a realocação e não a revitalização. “Que adianta revitalizar, construir posto de saúde e creche, se a gente vive com medo da casa cair ou barreira desabar, morando assim nesse isolamento”.
Os moradores dos Flexais reclamam também das ruas fechadas por tapumes de alumínio, colocados pela Braskem. Eles dizem que a empresa não deixa ninguém transitar pela área, obstruindo praticamente todas as ruas, do trecho da Ladeira do Calmon, em Bebedouro, até os fundos do Cepa, no bairro do Farol. “Nem quem tem casa na região, pode entrar; e se entrar, a vigilância da Braskem bota para fora”, destacou o comerciante. Segundo ele, se um morador retirar um tapume é acusado de vandalismo e pode até ser preso.
Os animais domésticos, abandonados pelos moradores que deixaram suas casas às pressas logo após a interdição dos imóveis, continuam sem proteção nenhuma, embora a propaganda da Braskem garanta que vem cuidando de cães e gatos, com a ajuda de um convênio com a Universidade Federal de Alagoas (Ufal). No entanto, segundo a coordenação da ONG SOS Pet Pinheiro, a maioria dos bichos vive da ajuda da comunidade, ou seja, da boa vontade de moradores da região que colocam água e ração para os animais.
IMA diz que obrigação da empresa está suspensa
A diretoria do Instituto do Meio Ambiente (IMA) disse, por meio da sua assessoria de comunicação, que a Braskem não tem mais obrigação de apresentar o projeto para a zona de exclusão. Havia essa determinação, mas segundo a assessoria do IMA, a condicionante foi suspensa. No entanto, as demolições – que estavam condicionadas à apresentação do projeto de RPPN – continuaram. Apenas alguns prédios, considerados históricos, foram preservados e devem ser restaurados.
“A condicionante que determina a criação de uma RPPN na região afetada pela mineração, em Maceió, encontra-se suspensa, uma vez que o Governo do Estado de Alagoas, por meio da Procuradoria Geral do Estado (PGE), ingressou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), quanto à legalidade dos acordos firmados entre a Braskem e a Prefeitura de Maceió, que dão quitação ampla, geral e irrestrita à empresa pelos danos causados pelas atividades de mineração, assim como para a transmissão de propriedade imobiliária para a Braskem e exploração econômica da área afetada”, afirmou a diretoria do IMA, por meio da sua assessoria de comunicação.
“A determinação consta na condicionante nº 27 imposta pelo IMA para a concessão da Licença de Operação Nº 2023.06121467685.EXP.LO, com base na Resolução Normativa Nº 08/2023, do Cepram, e na Lei 6.787/06, Art. 5, para que a Braskem execute a demolição e outras atividades de apoio nas áreas dos imóveis abandonados, localizados na região afetada pela subsidência, nos bairros de Bebedouro, Mutange, Bom Parto e Pinheiro”, acrescentou a assessoria do Instituto.
CEPRAM
Segundo o IMA, a proposta de proteção legal da área de demolição deveria abranger mosaicos ou área contínua, resguardadas àquelas áreas protegidas já previstas em Lei. A proposta deveria ser apresentada ao IMA e ao Cepram em até 180 dias, após a emissão da licença, a contar do dia 6 de dezembro de 2023, quando o documento foi emitido.
A decisão foi noticiada pelo Instituto. “O IMA determinou que a Braskem crie uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) e proibiu qualquer atividade comercial dentro da área do mapa de risco da região afetada pelas atividades de mineração, que obrigou milhares de famílias a abandonarem suas casas”, divulgou o Instituto.
“O objetivo é permitir que a vegetação ocupe toda a área, criando, assim, uma unidade de conservação. A Braskem deve apresentar a proposta de criação da RPPN para análise e aprovação do IMA e do Conselho Estadual de Proteção Ambiental (Cepram)”, acrescentou o Instituto.
Porém, uma semana antes do prazo final, o IMA revela que a obrigação foi suspensa, mas não diz quando a empresa foi desobrigada a apresentar o plano de ocupação da zona de exclusão. Alega apenas que a decisão está vinculada à ação que a Procuradoria Geral do Estado entrou na Justiça conta o acordo feito pela Prefeitura de Maceió com a Braskem.
PGE não se pronuncia
Procurada para se manifestar a respeito, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) não deu retorno. Segundo a assessoria de comunicação do órgão, nenhum procurador do Estado, que atua no caso, quis responder ou comentar o assunto.
No começo de 2024, a Justiça Estadual determinou que a Braskem apresente cópia da apólice do seguro-garantia realizada para substituir a ordem de bloqueio de mais de R$ 1 bilhão, feita pelo Governo do Estado para pagamento de parte das indenizações.
“De acordo com a sentença do juiz José Cavalcante Manso Neto, da 16ª Vara Cível da Capital, a mineradora tem um prazo de 15 dias para cumprir a decisão, caso contrário, haverá a suspensão da liminar e bloqueio do valor a favor do Estado”, informou a assessoria de comunicação da PGE.