Nos últimos cinco anos, a área devastada por queimadas no Nordeste equivale ao território de João Pessoa, capital da Paraíba. Entre 2019 e 2024, aproximadamente 21 milhões de hectares foram atingidos pelo fogo na região, conforme levantamento da plataforma MapBiomas. Apesar do avanço, o Nordeste registrou o menor crescimento percentual do país e foi a única região a apresentar uma leve redução entre 2023 e 2024.
A pesquisa aponta que o Nordeste ocupa o terceiro lugar no ranking nacional de áreas queimadas. Em 2019, os incêndios consumiram 3,5 milhões de hectares, enquanto em 2024 o total foi de 3,7 milhões, um crescimento de 6%. Mesmo com esse aumento, o avanço foi significativamente inferior ao de outras regiões, como o Sudeste, que registrou um crescimento expressivo de 234%, e o Norte, que ultrapassou os 100%.
Maranhão lidera queimadas no Nordeste
O Maranhão foi o estado mais afetado pelos incêndios, tanto em números absolutos quanto proporcionalmente ao seu território. Nos últimos seis anos, foram queimados 9,9 milhões de hectares no estado. Segundo a Agência Tatu, que realizou o levantamento com base no MapBiomas, o Maranhão apresenta a maior taxa proporcional, com 30 mil hectares queimados a cada 100 mil, seguido pelo Piauí (26 mil ha), Bahia (5,9 mil ha), Ceará (3,6 mil ha) e Paraíba (2,9 mil ha).
Diante desse cenário, o governo estadual lançou o Plano de Prevenção, Combate e Controle do Desmatamento e Queimadas, que busca reduzir o impacto dos incêndios por meio de ações conjuntas entre órgãos públicos, empresas, ONGs e comunidades locais. O Corpo de Bombeiros do estado também intensificou a fiscalização, utilizando drones para identificar focos de incêndio, além de investir na capacitação da população sobre práticas de prevenção e combate ao fogo.
Alagoas registra maior crescimento no número de queimadas
Embora o Maranhão concentre a maior área afetada, Alagoas registrou o maior crescimento percentual no período analisado. Em 2019, foram queimados 2.567 hectares, enquanto em 2024 esse número saltou para 7.143 hectares, um aumento de 178%.
A tendência de alta também foi observada em outros estados nordestinos, como Sergipe, que teve um crescimento de 126%, e Paraíba, com 83%. Em contrapartida, três estados da região apresentaram redução: Rio Grande do Norte (-70%), Ceará (-67,5%) e Piauí (-12,6%).
O Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA) identificou um aumento significativo nos focos de queimadas, inclusive em Áreas de Proteção Ambiental (APA). O órgão informou que utiliza geotecnologias para monitoramento e identificação dos responsáveis pelas queimadas ilegais. Segundo o IMA, em 2024 foram registradas 19 infrações, resultando em R$ 817 mil em multas.
Municípios mais afetados no Nordeste
O levantamento revelou que os municípios com maior área queimada na região foram:
- Formosa do Rio Preto (BA) – 194 mil hectares queimados
- Mirador (MA) – 146 mil hectares
- Balsas (MA) – 124 mil hectares
A reportagem tentou contato com as prefeituras dessas cidades para obter um posicionamento, mas não recebeu retorno.
Causas das queimadas e impacto ambiental
Especialistas apontam que a maior parte das queimadas no Nordeste está relacionada a práticas agrícolas inadequadas, principalmente o uso do fogo para manejo do solo sem o devido controle. “A maioria das queimadas tem alguma relação com desmatamentos e manejos inadequados para práticas agrícolas. A perda de controle provoca a proliferação de incêndios, especialmente se as condições ambientais forem favoráveis, como temperaturas altas, menor umidade, tempo seco e acúmulo de biomassa”, pontua Washington Rocha, geólogo e coordenador do MapBiomas Caatinga.
Rocha também destacou que o problema poderia ser minimizado com políticas de prevenção mais eficazes. Ele sugere a adoção de técnicas de manejo mais seguras, além de trabalho de conscientização e educação ambiental, especialmente voltado para agricultores familiares e pequenos produtores rurais.
Nordeste foi a única região a reduzir queimadas em 2024
Apesar do crescimento ao longo dos últimos cinco anos, os dados do MapBiomas indicam que o Nordeste foi a única região do Brasil a apresentar redução nas queimadas entre 2023 e 2024. No primeiro ano, foram 3,8 milhões de hectares queimados, contra 3,7 milhões no ano seguinte, representando uma queda de mais de 20%.
Enquanto isso, outras regiões do país registraram crescimento expressivo no mesmo período:
- Sudeste: aumento de 330%
- Sul: aumento de 210%
- Centro-Oeste: aumento de 200%
- Norte: aumento de 66%
O geólogo Washington Rocha explicou que essa redução pode estar relacionada a fatores climáticos. Segundo ele, existem ciclos de aproximadamente oito anos que alternam períodos de maior e menor incidência de queimadas, dependendo das condições ambientais. “Nos últimos quatro anos, esse ciclo parece ter reduzido aproximadamente para dois anos. Então, em 2024 houve maior umidade e isso inibe a proliferação dos incêndios e queimadas”, explicou.
No entanto, o especialista alertou que o cenário pode piorar nos próximos anos se não forem adotadas medidas preventivas eficazes. Ele destacou que as mudanças climáticas podem intensificar eventos extremos, tornando o clima mais árido e as temperaturas mais elevadas por períodos prolongados.
Ações do poder público
Diante dos impactos das queimadas, os estados nordestinos têm adotado diferentes estratégias para mitigar os danos ambientais.
Em Alagoas, o IMA reforça a importância das denúncias e recomenda que, ao identificar um foco de incêndio, a população entre em contato imediatamente com o Corpo de Bombeiros pelo número 193. O órgão também promove ações de conscientização com comunidades locais para incentivar práticas sustentáveis.
No Maranhão, o programa “Maranhão Sem Queimadas” realizou mais de 4.800 atendimentos e distribuiu 3.000 equipamentos para brigadas municipais em 2024. O Corpo de Bombeiros do estado também intensificou as operações de combate ao fogo, utilizando drones para monitoramento aéreo e promovendo campanhas educativas para evitar queimadas irregulares.
A expectativa é que, com investimentos contínuos em prevenção e fiscalização, a tendência de redução das queimadas observada em 2024 se mantenha nos próximos anos.