Um levantamento inédito realizado pelo Movimento Pessoas à Frente revelou que os chamados “penduricalhos”, que permitem vencimentos acima do teto constitucional, impactaram os cofres públicos em mais de R$ 11,1 bilhões no ano de 2023. O estudo analisou contracheques de servidores do Judiciário, Executivo e Legislativo, identificando que 42,5 mil pessoas recebem acima de R$ 44 mil por mês, valor correspondente ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que define o limite constitucional para remunerações.
O estudo, intitulado “Além do teto: análise e contribuições para o fim dos Supersalários”, foi conduzido pelo economista Bruno Carazza, pesquisador e professor da Fundação Dom Cabral, por encomenda do Movimento Pessoas à Frente. Os dados foram coletados de plataformas como o Portal de Transparência do Executivo Federal, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a base Dadosjusbr, e a seção de dados abertos da Câmara dos Deputados, abrangendo mais de 1 milhão de servidores públicos.
Resultados do levantamento
De acordo com a análise, 93% dos magistrados e 91,5% dos integrantes do Ministério Público ganham acima do teto salarial, contrastando com apenas 0,7% dos servidores da Câmara dos Deputados e 0,14% do Executivo Federal. Apesar de representarem menos de 40 mil pessoas, servidores do Judiciário e do Ministério Público correspondem a 70% dos que ultrapassam o teto salarial.
Dentre os 42,5 mil servidores com vencimentos acima de R$ 44 mil mensais, 28.780 estão concentrados em carreiras do Judiciário e do Ministério Público. No Executivo Federal, 13.568 civis e militares (0,14% do total) também ultrapassam o teto, com destaque para carreiras como diplomatas, advogados públicos e militares. Na Câmara dos Deputados, 152 servidores, de um total de 21.448, recebem mais do que um ministro do STF.
Segundo Carazza, o montante identificado no estudo é subestimado devido à ausência de dados completos e acessíveis. “Trata-se de uma amostra limitada, já que não foi possível incluir estados, municípios e tribunais de contas. Contudo, o estudo deixa claro que qualquer discussão sobre supersalários precisa incluir o Judiciário e o Ministério Público, onde estão concentrados os maiores vencimentos”, afirmou.
Impacto dos penduricalhos
Os chamados penduricalhos incluem benefícios como auxílios creche, alimentação, saúde, e até indenizações por férias não gozadas. Em 2023, esses itens geraram despesas significativas:
• Indenizações por férias não usufruídas: R$ 1 bilhão no Judiciário e R$ 464,2 milhões no Ministério Público.
• Gratificações por exercício cumulativo de ofícios: R$ 788,9 milhões no Judiciário e R$ 508,7 milhões no Ministério Público.
• Pagamentos retroativos: R$ 2 bilhões para o Judiciário e R$ 1,1 bilhão para o Ministério Público.
Lucas Porto, gerente de advocacy do Movimento Pessoas à Frente, enfatizou que esses altos salários são excepcionais e restritos a uma pequena parcela de servidores. “Enquanto a média salarial dos servidores é de R$ 3.300, é importante divulgar dados como esses para reforçar a confiança nas instituições e promover uma estrutura remuneratória mais justa”, destacou.
Discussões legislativas podem ampliar supersalários
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 31/2007, apensada à PEC 45/24 e votada em primeiro turno no dia 19 de dezembro, trata do controle de gastos, mas mantém dispositivos que permitem os penduricalhos.
O economista Bruno Carazza alertou que mudanças legislativas, como o projeto de lei 2.721 de 2021, podem ampliar ainda mais os supersalários. A proposta, que tramita no Senado Federal, cria 32 exceções ao teto, com um impacto estimado de R$ 3,4 bilhões apenas para quatro itens:
• Pagamento dobrado do adicional de um terço de férias.
• Gratificação por exercício cumulativo de ofícios.
• Auxílio-alimentação.
• Ressarcimento de despesas com planos de saúde.
Além disso, o projeto pode desencadear um efeito cascata, com servidores que recebem menos pleiteando equiparação salarial, elevando os custos para R$ 26,7 bilhões.
Diante dos riscos, especialistas defendem maior transparência e um debate robusto para reduzir as desigualdades salariais no setor público e evitar desequilíbrios orçamentários.