Na última terça (16), o desembargador Fábio Ferrario, do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ-AL), derrubou uma decisão do seu colega desembargador Márcio Roberto Tenório que determinava uma transferência de indenização no valor de R$ 25 milhões da Braskem para o Fundo de Amparo ao Morador (FAM).
O Fundo foi criado em 2023 pela prefeitura de Maceió, porém até hoje nunca recebeu nenhuma transferência do município, gerando até mesmo uma Ação Civil Pública da Defensoria Pública contra a gestão de JHC para que fossem destinados R$ 250 milhões para o FAM.
Na decisão, o desembargador afirmou que o recurso da Defensoria Pública “não tinha fundamento, pois não havia manifestação do primeiro grau [de um juiz ou juíza]”. Com essa decisão, o processo retorna ao seu ponto inicial.
A decisão original de Márcio Roberto Tenório foi vista como um avanço significativo para as vítimas dos desastres causados pela mineração nos bairros do Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol.
Ferrario ainda afirma que “o Município de Maceió compareceu aos autos, requerendo a reconsideração da decisão do desembargador plantonista, sob alegação de que a interposição do recurso ocorreu quando sequer há decisão proferida na origem. Por isso, sustenta o não cabimento do agravo e a ocorrência de usurpação de competência e supressão de instância, pois não houve análise do pleito pelo juízo a quo. Ainda, alega haver violação à separação dos poderes e ao pacto federativo, pois a decisão invadiria constitucionalmente asseguradas aos Poderes Executivo e Legislativo”.
Na decisão, Ferrario afirma ainda que a Prefeitura de Maceió “apontou que, com o recebimento de recursos, tem realizado diversas ações em benefício dos moradores da cidade de Maceió, entre os quais se incluem aqueles que residiam nos bairros atingidos. Além disso, defende que outras medidas estão em estruturação, o que se justifica por sua complexidade”.
O valor total do acordo firmado entre a Braskem e a Prefeitura de Maceió é de R$ 1,7 bilhão. Ricardo Melro, um dos defensores públicos envolvidos no caso, destacou que a decisão parcial já reconhecia a omissão da prefeitura em relação às vítimas. Sobre a decisão de Fábio Ferrario, Melro disse que ainda não analisou o mérito da questão, apenas entendeu que não cabia recurso por falta de uma decisão formal no primeiro grau. Ele destacou que “há precedentes no Tribunal de Justiça de Alagoas indicando que a omissão em decidir pode ser alvo de recurso, especialmente em casos urgentes onde há risco de perecimento de direitos”.
Melro explicou, ainda, que, após a espera por uma decisão do juiz de primeiro grau na sexta-feira (12), foi necessário recorrer no plantão judicial, já que a transferência de R$ 250 milhões estava programada para a segunda-feira (15). “O desembargador, reconhecendo a urgência, determinou o bloqueio dos recursos. Contudo, o juiz natural do caso, Fábio Ferrario, decidiu posteriormente que o recurso não cabia”, explicou.
O defensor ressaltou a importância de esclarecer a posição da Prefeitura de Maceió, que emitiu nota oficial afirmando que a alocação dos recursos ao fundo dos moradores seria feita, mas sem especificar prazos ou valores. Melro pediu ao juiz que intime a prefeitura para uma audiência, onde deverá informar quando e quanto será destinado ao fundo. “Ele também solicitou uma decisão formal sobre o pedido de bloqueio dos recursos municipais”.
Movimento lamenta decisão de magistrado: ‘em favor da Braskem’
Em resposta à decisão do desembargador do Tribunal de Justiça de Alagoas, Fábio Ferrario, Neirevane Nunes, do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), expressou sua insatisfação.
“Veja que não é a primeira vez que esse desembargador decide a favor da Braskem. É o mesmo que determinou que a via do [bairro] Mutange fosse liberada quando estava o acampamento de resistência dos moradores lá na entrada da unidade da Braskem ao lado do Colégio Bom Conselho. É a segunda vez que o desembargador ignora os direitos das vítimas e beneficia a Braskem”, disse ela.
Neirevane também criticou o sistema de justiça, afirmando que “muitos dos que estão no sistema de justiça esquecem que são funcionários públicos, que é o povo que mantém todo o sistema. Este mesmo sistema não serve à população, mas sim aos que detêm o poder político e econômico, como no caso da Braskem”.
A Defensoria Pública Estadual tem buscado garantir que parte do dinheiro da indenização da Braskem seja destinada ao Fundo de Amparo ao Morador.
Os defensores públicos Ricardo Melro, Daniel Alcoforado e Lucas Valença entraram com uma Ação Civil Pública solicitando que a Justiça obrigue o prefeito JHC a destinar os R$ 250 milhões que serão pagos pela Braskem ao fundo. A ação se baseia em diversas promessas públicas feitas pelo prefeito e seus assessores.