Dentro de cada família existe aquela pessoa responsável pelos presentes mais emblemáticos e significativos que um parente poderia receber. Quando nasce um bebê, ela está lá com um belo par de meias feito com as próprias mãos. Quando a casa precisa de uma nova cor, ela cria a própria decoração para os móveis. No caso de dona Lucinha Vergetti, uma aposentada de 66 anos, natural de União dos Palmares, que descobriu o crochê ainda na infância, a arte ultrapassou os limites e expectativas, transbordando numa roupa curiosa, que durou 7 meses para ser concluída e vestida no Fuxico, seu Fusca.
Lucinha possuía uma rotina regrada e, todos os dias, fazia o mesmo percurso para a padaria onde comprava pão, quando certa vez encontrou uma senhora de 99 anos chamada Dona Tutu, que lhe apresentou a arte que pratica até hoje. E mesmo sem as condições necessárias para comprar o material, nem Dona Tutu nem Lucinha desistiram da empreitada que estavam iniciando, sem saber a grande história em que tudo isso resultaria.
Embora tenha se tornado uma prática corriqueira, as peças de crochê que ela produzia e chegaram a ser vendidas nunca foram o suficiente para que isso se tornasse sua principal atividade. Um dos motivos disso, segundo Lucinha, foi a falta de incentivo aos artesãos da cidade. No entanto, ao passar por um momento complicado da vida e se ver diante de um quadro de depressão, o artesanato se mostrou um fiel companheiro para os momentos de angústia.
Com a dificuldade batendo à porta e um sentimento desolador no coração, Lucinha, nas ruas de União dos Palmares, deu de cara com um Fusca, e nele havia uma placa que dizia estar à venda. Foi amor ao primeiro test drive. Lucinha comprou e o batizou carinhosamente com o nome Fuxico. Daí para a frente, surpresas e alegrias aguardavam a incrível dupla que logo revirariam a cidade rural de Alagoas do avesso.
O Fuxico levou para a casa de Lucinha a sensação de bem-estar que estava ausente havia um tempo, mas ainda tinha muito o que ser feito. Ela queria cuidar de seu xodó, pintá-lo, dar uma cara nova. A ideia original era a de pintar uma imitação do crochê, porém, ao solicitar o orçamento da pintura para o carro, tomou um susto, pois não seria capaz de arcar com aquilo. Logo, por meio de um amigo, chegou a incrível solução de unir suas duas maiores paixões.
“Consegui comprar, já me sentindo um pouco melhor das minhas angústias. Mas aí veio o desafio que eu teria que pintá-lo. Pensei em plastificar com o desenho de crochê. Aí um grande amigo meu, Marcos, me deu a dica: por que não colocar seu trabalho nele? E daí deu início a essa minha grande paixão, meu Fuxico. Aí, eu resolvi fazer com o crochê, porque o trabalho era meu, tudo era meu, aí eu só ia entrar com o trabalho de fazer. Meu sonho realizado e minha cura da alma”, conta Lucinha.
O processo de cura durou tanto quanto a nova roupagem do Fuxico: sete meses. Uma história que começa no acúmulo de barbantes de sacos de pão encontrou o seu clímax na vestimenta do Fusca queridinho. Logo, como nenhum carro foi feito para ficar na garagem, com Fuxico não seria diferente. O veículo ganhou as ruas sob a direção da motorista e artesã Lucinha Vergetti, rodando por União dos Palmares e atraindo a atenção de todos os transeuntes que saíram de casa esperando qualquer coisa, menos um Fusca vestido de crochê.
No começo, conta Lucinha, a aparição da dupla suscitou reações das mais diversas, mas, no fim, acolheram com muito carinho. Lucinha revela ainda que a relação com o modelo Fusca é antiga e cercada por suas lembranças da juventude.
Quando terminar a roupa, Lucinha pretende ela mesma dirigir até São Paulo, onde Fuxico dará seu show. E em meio a tantas emoções, ela se vê livre da depressão e diz que foi tudo graças à realização de seus sonhos através de suas paixões.
“Hoje, me vejo feliz, realizada em ter minhas paixões juntas — o crochê e o fusca — e empolgada a cada dia que se passa. Venho incentivar a cada um que sonha, porque o sonho pode se tornar realidade, basta querer. Agradeço a Deus por cada momento da minha vida. As pessoas, no início, ficavam sem acreditar, hoje em dia, elas se motivam nele [no Fusca]. Então, minha paixão, o crochê, e depois a paixão pelo fusca, quando consegui ter as duas coisas. Eu realizei parte de meus sonhos em uni-los e espero que todos consigam realizar seus sonhos, pois isso é a melhor sensação do mundo. E isto me salvou e me deu vontade de amar minha vida intensamente.”
Fonte: GazetaWeb