O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), declarou nesta terça-feira (8), em entrevista ao programa Estúdio i, da GloboNews, que “não faz sentido algum” discutir a anistia de envolvidos e condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Para o decano da Corte, a proposta seria uma afronta à gravidade dos ataques às instituições democráticas.
“Estivemos muito perto de um golpe de Estado, uma tragédia política. Isso é extremamente grave. Seria a consagração da impunidade”, afirmou o ministro, destacando que os próprios presidentes da Câmara e do Senado têm consciência da impropriedade da proposta.
A discussão sobre uma possível anistia foi reacendida após um ato convocado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), no último domingo (6), em São Paulo. Com apoio de sete governadores, o evento teve como objetivo pressionar o Congresso pela votação do projeto de lei que concede anistia aos envolvidos no 8 de janeiro. O PL, de autoria da bancada bolsonarista, tem causado obstruções nas votações da Câmara enquanto sua urgência não é apreciada.
Gilmar Mendes defendeu a aplicação rigorosa da lei para os condenados e afirmou que os eventos de 8 de janeiro “não foram um passeio no parque” — em referência a uma frase usada anteriormente pelo ministro Alexandre de Moraes, relator dos processos no STF. “Ali se queria uma GLO [Garantia da Lei e da Ordem] para depois, talvez, já tomar o poder. Veja que é algo bastante grave, não se trata de algo ingênuo”, disse.
O ministro, no entanto, abriu espaço para a reavaliação de casos específicos. Ao comentar a situação da pichadora Débora dos Santos, condenada a 14 anos de prisão, Gilmar citou que a legislação prevê prisão domiciliar para mães com filhos sob sua guarda. “A progressão pode se dar de maneira extremamente rápida a partir da própria avaliação do relator”, explicou.
Além da pauta da anistia, Gilmar Mendes abordou outros temas de relevância nacional durante a entrevista:
ADPF das Favelas
Sobre o julgamento das ações policiais em favelas do Rio de Janeiro, o ministro comentou a politização do tema por parte de autoridades estaduais. “Começou uma guerra política em torno deste tema, e o próprio governador [Cláudio Castro] começou a dizer ‘a segurança piorou por conta da liminar do Supremo’”, afirmou. Mendes destacou que o STF manteve medidas como o uso de câmeras, mas determinou a entrada da Polícia Federal na investigação do contexto da violência no estado.
Supersalários no Judiciário
Gilmar também criticou os chamados “penduricalhos” que inflacionam os salários no Judiciário. Segundo ele, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vem tentando ordenar a situação ao estabelecer tetos e distinguir vencimentos de gratificações. “A rigor, o princípio da legalidade foi para os ares porque os vencimentos estão sendo fixados não mais por lei, mas por decisões administrativas”, apontou.
PEC da Segurança Pública
O ministro defendeu maior protagonismo do governo federal na segurança pública, com ou sem a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o tema. Para ele, a União deve atuar de forma integrada com estados, pois “os crimes hoje são, no mínimo, interestaduais”. Gilmar alertou que a questão já antecipa debates eleitorais: “A segurança pública já antecipa tema para a eleição de 2026”, concluiu.
Com 69 anos, Gilmar Mendes é o ministro mais antigo do STF, indicado em 2002 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Presidiu a Corte entre 2008 e 2010 e é conhecido por sua atuação firme em temas sensíveis da política e do Judiciário brasileiro.